CHICO D’ANGELO – O GLOBO
Ao longo dos anos, o Brasil construiu uma avançada política de controle da Aids, que é paradigma para outros países.
Entre os vários aspectos deste processo, há que se destacar o frequente ajuste das estratégias de atuação e a permanente mobilização social. Estas questões se interrelacionam, pois, além de garantir status de prioridade entre as políticas de saúde pública, o intenso ativismo de cerca de 500 organizações não governamentais proporciona sensibilidade e propicia ajustes que garantem a eficiência das ações voltadas para diferentes grupos populacionais.
Além da permanente ênfase na prevenção, a política de Aids tem sido levada a públicos estratégicos, mobilizando-os para o diagnóstico precoce do HIV. No entanto, dados do Ministério da Saúde demonstram que, se existem avanços nos grandes centros urbanos, ainda é preciso buscar alternativas para as cidades com menos de 50 mil moradores.
Em síntese, a Aids recua nas grandes cidades do Sudeste, do Sul e do Centro-Oeste, mas avança no interior do País. No Norte e Nordeste, as taxas aumentaram nas pequenas, médias e grandes cidades.
A Aids é um fenômeno social que envolve diversos tabus da sociedade, como a sexualidade, a homoafetividade e o uso de drogas. Não se pode executar uma política de controle da doença de forma homogênea, desconhecendo as amplas variações de comportamento.
Por isso, também são fundamentais ações que combatam o preconceito.
Estima-se que cerca de 630 mil brasileiros estejam infectados pelo HIV, mas supõe-se que 255 mil desses indivíduos nunca tenham feito o teste e, logo, não se saibam portadores do vírus.
Em 2009, a incidência da doença era maior entre moças do que entre rapazes, de 13 a 19 anos. Isto porque, em 2008, a proporção de mulheres com esse perfil que procuraram conhecer sua condição sorológica não passou de 50% do percentual estimado.
O medo do diagnóstico e da discriminação também são fortes aliados do mito de que a vulnerabilidade está limitada a segmentos específicos da sociedade, o que torna a importância do diagnóstico menor para o senso comum.
Consequentemente, entre 33% e 44% dos pacientes de Aids têm diagnóstico quando já apresentam o quadro clínico da doença e estima-se que 17% vão a óbito no primeiro ano após o diagnóstico.
Se os números mais recentes caracterizam a estabilização da doença, em termos nacionais, também deixam clara a necessidade de políticas locais diferenciadas, que levem em conta peculiaridades socioculturais da população.
Mobilizações itinerantes de testagem e iniciativas de organizações da sociedade civil muitas vezes acessam públicos com os quais os serviços formais têm dificuldade de aproximação. As pessoas vivendo com HIV e Aids são fundamentais neste esforço, pois são multiplicadoras de informações sobre a doença com maior credibilidade. Divulgar informações de forma estratégica e tornar o teste de Aids acessível a toda a população ainda são desafios que exigem a participação e o controle da sociedade.
Entre os avanços e recuos deste processo, cabe uma certeza: a política de controle da Aids é uma progressiva conquista da cidadania brasileira.
CHICO D’ANGELO é deputado federal (PT-RJ) e presidente da Frente Parlamentar HIV/Aids.
Nenhum comentário:
Postar um comentário