Gustavo Paul e Mônica Tavares – O GLOBO
BRASÍLIA. Antes mesmo de ter suas obras iniciadas, a hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu (PA), já faz história por seu aspecto emblemático e seus números superlativos. Demandou 35 anos de estudos, trata-se da maior hidrelétrica unicamente brasileira, da terceira maior do mundo, vai responder por cerca de 6,5% da energia do país, removerá mais terra do que o canal do Panamá (200,1 milhões de metros cúbicos de terra) e é o mais caro empreendimento hidrelétrico dos últimos anos, cujo investimento deve ultrapassar R$ 20 bilhões.
Mais do que isso, Belo Monte é considerada o parâmetro para a construção de hidrelétricas de grande porte na Região Amazônica.
Última fronteira da hidreletricidade brasileira, existem ali 22 estudos para geração energética, cujo potencial estimado é de 49 mil megawatts (MW), metade da geração do país.
Ao mesmo tempo, a polêmica em torno da obra é proporcional a seu tamanho. Os grupos adversários acusam-na de não ter a eficiência energética que promete e de causar danos irreparáveis às populações ribeirinhas e indígenas, além de provocar efeitos deletérios ao meio ambiente. Para eles, Belo Monte representa um risco para o futuro da Região Amazônica.
É tudo isso que estará em jogo no leilão previsto para a próxima terça-feira, na sede da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Dois consórcios devem disputar a licitação, e ganhará quem oferecer a menor tarifa de energia, cujo valor teto é de R$ 83 o megawatt/hora.
Para os milhões de consumidores brasileiros, ter Belo Monte em pé garantirá o crescimento da oferta de energia nas próximas décadas, a preços mais baratos e com menor impacto ambiental. Diante de um cenário de crescimento constante do consumo, a usina garante uma oferta substantiva de energia.
— O Brasil tem um consumo per capita de 2.300 quilowatts/ hora ao ano (kW/h), enquanto um país desenvolvido da Europa está entre sete mil e nove mil kW/h por ano. Nos EUA, chega a 14 mil kW/h anuais. Então não é difícil imaginar que o consumo per capita no Brasil vai aumentar muito. Temos de trabalhar com a necessidade de duplicar nossa geração até 2030 — explica o ministro de Minas e Energia, Márcio Zimmermann.
‘Belo Monte tem de ser o paradigma’, diz Tolmasquim Sem Belo Monte, e equação energética brasileira fica mais cara ou mais suja, ou as duas coisas ao mesmo tempo, diz o governo.
A opção seriam usinas nucleares, térmicas a óleo ou alternativas de menor porte. Zimmermann lembra que a energia eólica, por exemplo, não pode representar mais de 20% do parque de geração, por depender do pouco confiável regime de ventos: — O carro-chefe da expansão brasileira é a hidreletricidade. Se não tiver Belo Monte, vamos ter de implantar outra fonte, e a prática mostra que são usinas cujo efeito ambiental é pior.
Dentro dessa estratégia, o governo não quer correr risco com Belo Monte. Quer respeitar o planejamento e os estudos socioambientais aprovados pelo Ibama. Caso contrário, não há dúvidas de que será mais difícil viabilizar as demais usinas. Na segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2), a bacia do Rio Tapajós, no sul do Pará, prevê sete empreendimentos.
— Belo Monte tem de ser o paradigma, uma obra exemplar, porque se não fizermos algo sustentável vamos condenar toda a expansão elétrica brasileira, que está na região amazônica — admite o presidente da Empresa de Planejamento Energético (EPE), Maurício Tolmasquim.
O coordenador do Programa de Planejamento Energético da COPPE/UFRJ, Nivalde Castro, ressalta que, ao construir a usina, o país estará reafirmando a sua posição de ser uma das grandes economias verdes do mundo: — A Amazônia é muito grande.
Ali onde vai ser feita a usina é um pedacinho muito pequenininho da Amazônia.
Do ponto de vista econômico, Belo Monte é um desafio. Para aumentar a margem de lucro, os empreendedores terão de destinar 20% da energia para o mercado livre (onde a tarifa pode ser bem mais elevada que o teto estabelecido pelo governo) e para os autoprodutores.
É nessa equação que os empresários esperam arrecadar mais e, com isso, bancar o custo real da obra. O valor de R$ 19,6 bilhões — estabelecido pelo governo — é considerado irreal e a obra deve sair na casa dos R$ 25 bilhões, diz um empresário.
— Normalmente, o valor do risco geológico de uma usina está em torno de 20%, o que significa R$ 4 bilhões neste caso — diz o consultor Afonso Henriques.
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