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quinta-feira, 21 de julho de 2011

BRASIL NA LUTA CONTRA A FOME



Autor(es): Edmilson Gama da Silva
Correio Braziliense - 21/07/2011




Presidente do BRB

A eleição, mês passado, do brasileiro Francisco Graziano para a direção da FAO, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, reveste-se de forte apelo simbólico. Embora só venha a assumir o cargo em 2012, sua eleição já estabelece um diferencial na luta mundial por segurança alimentar.

O Brasil foi, por muito tempo, um dos países mais estigmatizados pelo problema da fome, paradoxo intolerável, considerando-se sua formidável pujança agrícola. De um momento em diante — já no governo FHC, mas com maior ênfase no governo Lula —, o país passou da defesa ao ataque. Decidiu investir fortemente no combate à pobreza, não apenas criando programas sociais de transferência de renda, mas levando o tema aos fóruns internacionais, propondo que suas iniciativas internas se estendessem ao âmbito internacional.

Se internamente essas ações registravam êxito, era natural que fossem ao menos consideradas nas instâncias multilaterais. Só agora, porém, o foram, com a eleição de Graziano, por um escore apertado (92 a 88 votos), definido, não por acaso, pelo apoio dos países pobres da África e da Ásia. Além da visibilidade que o cargo proporciona ao país, tem-se a oportunidade de recolocar a discussão em bases mais eficazes e criativas, que não a meramente socorrista.

Não será possível erradicar a fome apenas com o envio de comida aos famintos, como é praxe. É medida tópica, que mais humilha que sacia. É preciso que se desenvolvam ações simultâneas e efetivas a curto, médio e longo prazo, como foi feito no Brasil, único país a inserir o combate à fome em sua Constituição (artigo 6º).

Sabe-se que não se resolve problema algum, muito menos o da pobreza extrema, apenas com leis. É preciso determinação política, vontade sincera de agir. Mas não há dúvida de que a lei — sobretudo a Lei Maior — sinaliza algo. E o Brasil, ao inscrever a segurança alimentar como dever do Estado — e, por extensão, direito do cidadão — assumiu um compromisso moral perante sua população.

Esse o primeiro diferencial: tornar a segurança alimentar não um gesto de caridade, como tem sido ao longo da história, mas um dever. A partir daí, muda por completo a índole desse serviço. No Brasil, a mudança impôs políticas públicas criativas, que, no primeiro instante, geraram as transferências de renda, as bolsas.

Simultaneamente, mas com efeitos mais demorados, foram deflagradas ações educativas, que consistiram em colocar nas escolas todas as crianças, mesmo sem ainda oferecer ensino de primeira qualidade. Esse o estágio em que estamos, sabendo que é preciso avançar, já que o tema não possibilita recuo.

São medidas que, uma vez acionadas, tornam-se irreversíveis — e independem de quem está no governo. De tal modo foram saudadas pela população que nenhum governante, de qualquer partido, poderá suprimi-las, sem ocasionar uma convulsão social. Fome, por sinal, não tem ideologia. É um obstáculo à vida e, como tal, precisa ser permanentemente combatida.

Por fim, as medidas de longo prazo, postas em prática juntamente com as demais: obras de infraestrutura, saneamento básico, políticas de crédito, investimento em saúde pública e segurança, além de ações específicas na melhoria da qualidade do ensino, que implica aprimoramento da qualificação dos professores e da estrutura física da rede escolar. Sem bons professores e boas escolas, não há educação digna desse nome — e sem ela não se supera o estágio da pobreza.

Resumo da ópera: é preciso não apenas dar o peixe, mas ensinar a pescar, o que significa não apenas manter vivos e alimentados os que vivem na pobreza, mas dar-lhes condições de competitividade profissional e autoestima, que permitam que se mantenham por conta própria, passando de párias a gente.

É, em suma, um projeto político que pode durar três, quatro gerações para cumprir o seu ciclo. Mas o que é isso diante dos muitos séculos em que o desafio, mesmo inadiável, foi simplesmente varrido para baixo do tapete? O Brasil ainda tem muito a fazer nessa matéria, mas já deu os passos iniciais. E o mundo dito civilizado, que ainda hesita em reconhecer a realidade desse drama?

Basta confrontar o orçamento da FAO para o biênio 2012-2013: US$ 1 bilhão. Considerando-se que, segundo a mesma FAO, mais de 1 bilhão de pessoas passam fome no mundo, isso significa um dólar por faminto ao longo desse período. E o que é isso diante dos megaorçamentos militares e da ajuda trilionária aos bancos em face da crise financeira de 2008? Indica apenas que os países ricos não despertaram ainda para o óbvio: que a paz jamais será conquistada num mundo em que se morre de fome.

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